Ignorar o contexto é fortalecer a doença
Em uma recente sessão de terapia, minha terapeuta trouxe um exemplo que achei sensacional. Imaginemos alguém que está com uma infecção no dedinho do pé. Essa pessoa busca algum profissional que, prontamente, receita alguma pomada, ou qualquer que seja o medicamento contra a tal infecção. Só que nem questiona como é que aquele processo infeccioso se instaurou. Inicialmente, talvez, a intervenção médica faça algum sentido e ofereça algum bom resultado, com o tempo, no entanto, o problema retorna. A pessoa, intrigada, retorna ao médico que repete o procedimento, novamente, sem se questionar sobre o desenrolar daquele processo, os elementos que nele podem estar influenciando. O problema, por enquanto, “desaparece”, entretanto, retorna. A pessoa, exaurida, procura agora outro profissional, este mais atento, mais curioso, mais questionador. O novo profissional trata os sintomas, receita alguma coisa, mas não sem antes perguntar sobre os hábitos daquele indivíduo, como, que tipo de calçado tem utilizado, de que maneira e com que frequência o tem utilizado, por onde tem andado, e assim por diante. Ou seja, delimita o contexto, as circunstâncias daquele sujeito que, talvez, usasse um sapato apertado demais e não tivesse a preocupação de deixar o “pé respirar”. Descobrem, assim, que havia um contexto em torno do problema para que ele sempre retornasse.
É por isso que, ao falarmos de saúde, ignorar o contexto é o mesmo que fortalecer a doença.
Esse é um excelente exemplo para compreendermos certas situações de nossas vidas. Às vezes repetimos as mesmas formas de nos relacionarmos, por exemplo, ou, então, sempre acabamos tendo problemas com os colegas de trabalho independentemente de onde estejamos. Podemos nos questionar sobre os motivos e podemos até procurar por “receitas milagrosas” que nos ajudassem a lidar com nossas questões interpessoais. Mas pouco ou nada olhamos para o contexto que nos cerca, para os elementos que nos rondam e que, com certeza, influenciam para a manutenção de certas questões. Posso ser uma pessoa muito ciumenta, talvez por isso minha possessividade e obsessão por saber onde a outra pessoa está a cada minuto. Posso ser uma pessoa muito arrogante, com dificuldade de ouvir e que interpreta tudo como uma pesada crítica, daí sempre acabar em maus lençóis com meus colegas no trabalho. Ou talvez eu esteja me submetendo a tipos de relações extremamente desrespeitosas e ignorando que posso escolher sair delas. Fato é que não adianta sairmos em procura de fórmulas mágicas se não olharmos, de maneira ampla e profunda, para as inúmeras outras questões que orbitam em nossa volta.
O contexto é imprescindível para a compreensão de nossas questões, sejam elas de saúde física ou emocional. É necessário que passemos por um processo de dar-nos conta dos elementos adoecedores que, de alguma forma, temos alimentado ou permitido que ficassem em nossas vidas contribuindo para que a situação da qual nos lamentamos continue sendo, por tanto tempo, o motivo de nossos lamentos. E isso é difícil. É difícil reconhecer que, por vezes, o problema somos nós e que por vezes precisaremos nos afastar daquilo que achamos tão conveniente e agradável. Contudo, é necessário. Freud já nos provocava com a pergunta “qual é a sua responsabilidade na desordem da qual se queixa?”. Ainda que o campo esteja me oprimindo, e ainda que o campo seja imutável, posso mudar a mim, mudar de lugar, posso mudar a minha forma de interagir com os elementos que me adoecem. Antes, no entanto, preciso reconhecer que elementos são esses e que relações são essas estabelecidas entre nós.
(Texto de Amilton Júnior - @c.d.vida)
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